Frequentemente chegam-nos questões sobre o tão anunciado “rim biónico”, ou rim bioartificial, que se encontra atualmente em desenvolvimento nos Estados Unidos. Apresentado como “o fim da hemodiálise” em diversas páginas de Internet e notícias que rapidamente se espalham por todo o mundo, é natural que para muitos de nós se torne numa verdadeira esperança, mas que tarda em se tornar uma realidade.
O rim bioartificial, do tamanho de uma chávena de café, consiste em dois módulos que trabalham juntos para eliminar os resíduos. Primeiro, um módulo que consiste num filtro que processa o sangue recebido para criar um ultrafiltrado aquoso que contém toxinas dissolvidas, além de açúcares e sais. O segundo módulo é um biorreator de células renais que processa o ultrafiltrado e envia os açúcares e sais de volta ao sangue. No processo, a água também é reabsorvida no corpo, concentrando o ultrafiltrado na “urina”, que será direcionada para a bexiga para excreção.
De facto, a nível mundial a hemodiálise é o tratamento mais comum para a insuficiência renal crónica desde os anos 60 e, apesar de ter evoluído muitíssimo, para quem passa por estes tratamentos dia após dia, sabe que também tem os seus efeitos secundários, que é limitada no tempo e que interfere com o bem-estar e o dia a dia de todos que com ela têm que conviver.
Existe também a diálise peritoneal, que resolve alguns dos problemas da hemodiálise, mas que também tem as suas próprias limitações e que ainda é muito pouco utilizada no nosso país. E o transplante, apesar de tudo a forma de tratamento mais próxima de se ter uns rins nativos saudáveis, mas que também tem uma esperança média de vida, obriga à toma de medicamentos imunossupressores e nem sempre corre tão bem como esperado.
Assim, é natural que haja muita curiosidade e expectativa relativamente a esta forma de tratamento, esta quinta alternativa de tratamento. A APIR acompanha naturalmente com entusiasmo as investigações que se vão fazendo e, aproveitando uma publicação recente que a equipa de investigação colocou no Facebook, no final do ano de 2019, aqui apresentamos a versão traduzida, para que todos possam estar informados relativamente à situação atual e a expectativas de futuro.
Como poderão perceber pelo comunicado, apesar de as investigações serem promissoras, este rim bioartificial nunca estará disponível num horizonte inferior a 5 anos. Este é o tempo necessário e previsto para completar todos os ensaios clínicos antes da sua autorização para comercialização nos Estados Unidos. Após essa fase, será necessária a sua aprovação a nível da Europa, o que pode demorar mais alguns anos. Mesmo com o dispositivo aprovado, põe-se a questão do pagamento do mesmo. Estará disponível a custo zero, tal como a hemodiálise ou o transplante são hoje em dia, totalmente financiados pelo Serviço Nacional de Saúde? Durante todo este processo dos ensaios clínicos também se irá começar a compreender se esta alternativa será benéfica para qualquer tipo de paciente, ou se existem contraindicações que ponham em causa o seu funcionamento em algumas pessoas (por ex. doentes com outras patologias associadas, limites de idade mínimos/máximos, etc.).
Concluindo, apesar de ser uma investigação promissora, ainda tem um longo caminho a percorrer antes de se tornar uma realidade.
O que podemos fazer durante este tempo?
- Pode ajudar a financiar a investigação, doando a quantia que entender em https://bit.ly/2tFkxTi
- Pode informar-se melhor sobre o projeto: https://pharm.ucsf.edu/kidney e https://www.facebook.com/ArtificialKidney
- Pode inscrever-se como voluntário para os ensaios clínicos (embora numa fase inicial seja dada prioridade a residentes nos EUA): http://tiny.cc/6kx1iz
Publicação completa (traduzida) da equipa do Kidney Project no Facebook a 19/12/2019:
«Caros amigos do Kidney Project:
Com o ano de 2019 a chegar ao fim, queremos agradecer o vosso apoio durante este ano e fazer um ponto de situação relativamente aos ensaios clínicos do rim bioartificial. Inicialmente tínhamos como objetivo começar os primeiros ensaios em humanos no ano passado, mas o preenchimento dos requisitos regulamentares para o início dos ensaios acabou por se tornar um processo mais longo do que o esperado. Uma vez que o nosso dispositivo é fabricado com materiais novos em implantes médicos, a avaliação pré-clínica à qual eles devem ser submetidos é minuciosa e demorada, mesmo para um dispositivo com a designação «FDA Breakthrough», como é o nosso caso.
[«FDA Breakthrough» é uma designação da Administração de Medicamentos e Alimentos dos Estados Unidos (FDA) que agiliza o desenvolvimento e a aprovação de medicamentos/terapias que são considerados inovadores ou revolucionários.]
Desde o verão que temos estado em contacto com a FDA [Administração de Medicamentos e Alimentos dos Estados Unidos] para determinar os requisitos de segurança específicos para começar os ensaios em humanos. Neste momento já temos uma ideia clara sobre as expectativas relativamente ao desenho do ensaio e a documentação e acreditamos que estamos bem posicionados para obtermos uma avaliação favorável. No entanto, ainda estamos à espera de informações da FDA relativamente aos requisitos para os testes de biocompatibilidade, necessários para garantir que os nossos materiais são seguros em contacto com o sangue humano. Felizmente, os nossos parceiros da FDA compreendem o impacto da nossa tecnologia e estão tão dedicados como nós em garantir o desenvolvimento de um produto seguro e eficaz para os pacientes.
Mas fazer chegar um produto aos pacientes só é possível se tivermos fundos suficientes. O Kidney Project está dependente da generosidade de dadores para concluir esta missão ambiciosa, e o fator mais importante para garantir o ritmo do nosso progresso são os níveis de financiamento. Quanto mais recursos tivermos, mais rápido podemos avançar. Por outro lado, quando não recebemos financiamento suficiente, temos que abrandar o desenvolvimento, para conservar os nossos fundos. Até à data já conseguimos mais de 15 milhões de dólares em bolsas e doações, mas iremos precisar de mais para concluir todo o desenvolvimento pré-clínico e os ensaios clínicos para demonstrar a eficácia do rim bioartificial nos pacientes. Os progressos que já conseguimos fazer são amplificados devido aos recursos disponíveis no meio universitário em que nos encontramos, mas infelizmente não temos o luxo de ter uma retaguarda de investidores de negócios que podem continuar a alimentar o projeto quando os fundos diminuem.
O primeiro ensaio clínico irá testar uma versão em pequena escala do filtro de sangue num circuito de diálise externo, para garantir que o material do dispositivo é seguro para uso humano. Este ensaio estava previsto para 2018, mas devido aos atrasos que fomos encontrando, esperamos agora começar em 2020. Nessa altura iremos avaliar a segurança e o desempenho do filtro de sangue implantado à escala clínica, seguido da avaliação do dispositivo integrado (filtro de sangue + biorreator) para demonstrar a eficácia do rim bioartificial à escala clínica. É nosso objetivo chegar a esta última fase dos ensaios clínicos em menos de 5 anos, partindo do princípio que teremos financiamento suficiente e que não iremos encontrar contratempos científicos, tecnológicos ou regulatórios.
Os primeiros ensaios terão lugar na Universidade da Califórnia – San Francisco [Califórnia, EUA] e no Centro Médico da Universidade Vanderbilt [Tennessee, EUA]. À medida que os estudos forem avançado, iremos procurar parceiros nos Estados Unidos e noutros países, para a realização dos ensaios clínicos. Durante este processo também iremos trabalhar com os fabricantes para discutir e gerir os detalhes da produção. Quando os ensaios estiverem concluídos e a aprovação da FDA for garantida, o dispositivo ficará imediatamente disponível para os pacientes.
Queremos agradecer o vosso apoio, paciência e entusiasmo para com o Kidney Project. Estamos cada vez mais empenhados em tornar o rim bioartificial uma realidade o mais rápido possível. E não o conseguiremos sem o vosso apoio!
William Fissell, MD – Centro Médico da Universidade Vanderbilt
Shuvo Roy, PhD – Universidade da Califórnia – San Francisco»
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