Chamo-me Inês, tenho 16 anos e vivo em Montemor-o-Velho (Seixo de Gatões). Hoje vou contar-vos a minha breve história enquanto insuficiente renal …
Sensivelmente a meio de 2013 a minha mãe decidiu emigrar. A ideia de ir viver para fora do país não me entrava na cabeça por nada e, como sempre fui teimosa, após muitas “birras”, os meus pais deixaram-me ficar. Fiquei com uma amiga dos meus pais em quem tinham 100% de confiança, mas esta estadia com a senhora durou pouco tempo. Brincando um pouco com a situação, parece mesmo que sou impossível de aturar…
Depois de a senhora se cansar, e uma vez que eu insistia em ficar em Portugal, fui viver com a minha madrinha (irmã do meu pai). Ali eu sentia-me em casa, estava mesmo feliz!
Até que o tormento começou, mas nunca quis dizer nada a ninguém, talvez por vergonha… Comecei a urinar imenso, chegava a fazê-lo na cama, sem dar conta, durante a noite. Eu pensava para mim: “Isto não é normal! Mas como vou eu contar isto a alguém? QUE VERGONHA!”. Ao fim de algum tempo, ganhei coragem e falei com a minha madrinha acerca do que me andava a acontecer. Uma vez que os meus pais estavam fora do país, ela decidiu telefonar-lhes para juntos tomarem uma decisão. E assim foi, dentro de pouquíssimas horas ela já tinha uma resposta para mim.
Nesse mesmo dia, quando regressei da escola, a minha madrinha estava à minha espera para me dizer que teria de faltar à escola no dia seguinte porque iria fazer análises. A espera pelos resultados foi horrível, parecia que o tempo não passava e a ansiedade de saber o que se passava não me largava, lembro-me que chorava dia e noite à espera do telefonema do médico. O tão esperado telefonema chegou com uma notícia menos boa: teria de me apresentar no Hospital Pediátrico de Coimbra nas próximas 24 horas e, como era de esperar, entrei em pânico.
Passei a noite em branco. Na manhã seguinte estava no Hospital e não demorei muito a ser atendida. Foi um dia carregado de análises e exames, ninguém me dizia nada, via a cara dos médicos a olharem uns para os outros e não percebia nada do que queriam transmitir. Até que, ao final da tarde, vi a médica que me tinha recebido nas urgências a caminhar na minha direção, sentar-se ao meu lado e dizer: “Inês , eu não te trago boas notícias, os teus rins não funcionam e o teu sangue já está carregado de coisas menos boas. Não te podemos deixar ir para casa, terás de ficar connosco e temos de começar a fazer algo pela tua saúde já hoje, porque ela já é muito pouca.” Ao ouvir aquilo, as lágrimas escorriam-me sem parar pela cara, o meu coração parecia nem bater, via-me num buraco negro sem fundo, não sabia o que fazer.
Foi então que, após a ida ao bloco para colocar um cateter, comecei a fazer hemodiálise no HUC (quando iniciei, o sistema de hemodiálise do Hospital Pediátrico não estava terminado, mas depois passei para lá). Eram 4 horas ligada a uma máquina, 3 vezes por semana, uma rotina horrível que me perseguiu durante 9 meses.
Com todos estes percalços, a minha mãe regressou a Portugal. Foi-lhe dito que havia a possibilidade de transplante como única solução para me livrar da hemodiálise. Foram feitos os testes e felizmente éramos quase 100% compatíveis uma com a outra. Outra espera menos boa e que me fez quase morrer de ansiedade foi a marcação do transplante…. Chegou o dia 9 de dezembro de 2014, era o grande dia, o dia em que me iria livrar das horas ligada à máquina. Correu tudo como planeado, eu e a minha mãe ficámos ótimas!
De novo a uma vida normal, eu nunca me tinha sentido tão bem e orgulhosa de mim mesma, sem falar do quão grata estava pelo gesto da minha mãe.
Passaram-se 5 meses e algo de errado estava de novo a atormentar-me, estava a crescer-me um caroço no pescoço, que aumentava de dia para dia e eu não encontrava explicação para tal. Numa consulta de rotina queixei-me à Dra. Carmen e ela explicou-me que poderiam ser os meus gânglios linfáticos inchados por causa da imunossupressão (comprimidos que baixam as defesas com o objetivo de evitar a rejeição do rim doado). Queríamos nós que fosse apenas isso, mas não, não havia forma de o caroço desaparecer e, sendo assim, teria de se retirar um pedaço para mandar para análise. Depois de mais uns dias de ansiedade para saber do que se tratava, recebi a notícia de que era um linfoma. Eu nunca tinha ouvido falar naquele nome, não tinha sequer uma pequena noção do que era, mas explicaram-me então que era um tipo de cancro que afetava o sistema imunitário. Mais uma má fase: 5 meses de quimioterapia, que felizmente não correu muito mal. Com o meu ânimo, força de vontade e sem faltar, a ajuda de todos os que me acompanharam, consegui ultrapassar mais esta fase.
Hoje, com 1 ano e meio de transplante e 10 meses após deixar a quimioterapia, sinto-me uma pessoa completamente normal, por vezes até me esqueço destes percalços que constituem o meu passado!
Quero aproveitar para agradecer a todos os que me apoiaram nestas fases menos boas da minha vida, em especial à Dra. Carmen , nefrologista que acompanhou o meu caso, a todos os enfermeiros da unidade de diálise dos HUC, à enfermeira Rute e ao enfermeiro Luís , enfermeiros que me acompanharam nos últimos meses de diálise no Hospital Pediátrico, à enfermeira Matilde, que me incentivou a juntar-me a esta Associação, ao Dr. Brito e todos as/os enfermeiras/os da unidade de Oncologia do HP, que cuidaram sempre bem de mim e que me apoiaram e encorajaram quando pensava que já nada havia a fazer.
Esta é a minha história, uma história triste, mas alegre ao mesmo tempo. Mesmo na doença, posso afirmar que fui feliz, graças a todos os que me acompanharam.
Quero deixar um pequeno conselho a todos aqueles que, pelo mesmo ou outro motivo, se sentiram desmotivados a cuidar de si mesmos: nunca desistam, aprendam a cuidar de si próprios! Eu aprendi e neste momento é o que gosto mais de fazer. Um sorriso na cara e pensamento positivo é meio caminho andado para que tudo se resolva!