Decorria o ano de 2013 quando numa manhã no início de março o Xuxu, numa consulta de Nefrologia foi diagnosticado com IRC. Mesmo assim, sendo ele homem otimista e sem ter a real noção da gravidade da sua situação, saiu do consultório a pensar “OK, tenho IRC”. Como se trata de uma doença silenciosa e evolutiva, e como ele não sentia nada a nível físico, achava que seria uma coisa passageira e fácil de resolver.
O Xuxu era um “tour driver”, que vivia na Boa Vista, em Cabo Verde, uma ilha paradisíaca. Xuxu adorava a sua vida, pois no seu trabalho todos os dias tinha a oportunidade de colecionar amizades e experiências de vida quando fazia excursões à volta da Ilha.
Naquela época, Xuxu tinha o prazer de desfrutar da sensação de chegar à praia de Santa Mónica, a qual tinha uma extensão de 18 Km de areia branca e água azul turquesa, de uma transparência espetacular e tão quentinha que lhe fazia, por momentos pensar que estava num mundo só seu e que tudo estava bem…
Nesse período, Xuxu foi eleito Presidente da LCBV (Liga dos Condutores da Boa Vista), que era um grupo organizado de taxistas especializados na área de excursões.
Tinha também acabado de comprar uma casa perto do mar, estava a iniciar o processo de aquisição de uma nova viatura e a viver pela primeira vez uma relação séria. Curiosamente, para ele estava a viver uma fase da sua vida maravilhosa, estava como uma criança a aprender a andar, porque antes de conhecer a atual companheira, era muito aventureiro. Adorava curtir a vida intensamente, devido também ao facto de viver num paraíso e de ter a oportunidade através do trabalho de interagir com várias mulheres de diversas nacionalidades. Era uma vida de sonho, apesar de todas dificuldades que estavam por vir…
A primeira grande dificuldade foi a evacuação para Portugal, pois quando chegou a Lisboa pela primeira vez, tudo era novidade para ele: demasiados carros, multidões de pessoas e, principalmente, o frio. Isso foi o que lhe afetou mais, porque ao chegar dentro do aeroporto estava um bom clima, enquanto que ao sair, foi um choque, nunca tinha sentido nada parecido, era muito frio.
O facto de já ter os pais e irmãs a viver em Lisboa e a mãe já ser insuficiente renal, ajudou imenso na sua adaptação como doente renal, visto que ela já tinha feito seis anos de hemodiálise e estava na altura transplantada. A mãe acompanhou-o em todas as consultas e exames, porque às vezes havia perguntas que ele não sabia responder com exatidão e que a mãe já sabia. Este facto foi extremamente útil na hora de escolher o tipo de tratamento que ia fazer. Ele, pensando na sua comodidade, quis logo optar pela diálise peritoneal, mas após ouvir a voz da experiência da mãe, mudou de opinião e decidiu optar pela hemodiálise, por ser o teoricamente mais seguro a nível das infeções, visto ser um tratamento feito nas clínicas especializadas para tal. A mãe levou-o à APIR, o que foi de extrema utilidade porque ele acabou por adquirir uma bagagem enorme a nível de informação sobre a sua doença, através de participações em várias atividades da APIR. Nesta sequência, começou a fazer trabalho voluntário na Associação, onde veio a ser eleito como dirigente nacional, onde criou e executou o projeto “Ponte Amiga”, que consistia em receber/acompanhar e assistir outros colegas evacuados, a fim de tornar menos dura a adaptação à doença e à cidade, nomeadamente na ajuda para obtenção de documentos, passes e apoios sociais. Sempre que ajudava um colega, o Xuxu ia evoluindo e adquirindo uma bagagem a nível de partilha de conhecimentos e experiências.
Atualmente, tem uma opinião muito própria acerca da abordagem que é feita entre a transição da hemodiálise para o transplante. Sendo que já tem seis anos de hemodiálise e dá-se muito bem com o tratamento, acha que já descobriu a receita certa para se viver bem com a hemodiálise. O transplante seria um reinício, um novo aprendizado, em que teria de aprender a viver como transplantado e com tudo o que isso acarretava. Para quê recomeçar um processo, se o Xuxu já tinha encontrado o seu porto seguro?!
Sendo a vida tão curta, pois nunca sabemos até quando…. há que aproveitar o melhor dela, ou seja: A FELICIDADE!!!