
O meu nome é Manuela da Silva Marques Pereira, tenho 38 anos, sou casada e tenho dois filhos lindos. Entrei nesta vida de doente renal em outubro de 2014, quando numas simples análises de rotinas recebi a notícia. Para mim não foi um grande choque, porque sempre cresci com esta realidade, porque tinha um tio a fazer hemodiálise e um pai já transplantado há mais de 30 anos.
Passado um dia de ter recebido as análises, fui internada de urgência no Hospital de Santa Maria, em que me deram a escolher dois tipos de tratamento: diálise peritoneal ou hemodiálise. Depois de muito ponderar, escolhi a diálise peritoneal, que até hoje não me arrependo de ter escolhido.
Foi-me colocado um cateter na barriga, que é basicamente uma “mangueira”. Consegui aguentar ainda um mês sem tratamento, para o cateter ficar pronto a ser usado, e durante este tempo aprendi a fazer diálise manualmente. Depois aprendi a trabalhar com a máquina, e tudo foi correndo sobre rodas.
Trabalhava e fazia uma vida normal. Passado um ano, ganhei uma infeção no orifício do cateter e, depois de muitos antibióticos, lá teve de ser retirado, e foi colocado outro do lado esquerdo. Estive 15 dias sem fazer tratamento, até poder usar o novo cateter. 15 dias era pouco, mas os meus valores estavam demasiados altos, experimentámos mesmo assim e felizmente correu bem.
Passado um ano, no dia 5 de maio, recebi a tal chamada que tanto esperamos, de Coimbra, a dizerem que tinham um rim para mim. Lá fui eu e nunca mais me esqueço do que disse ao meu filho de 5 anos: “A mãe vai ficar boa”. É o que esperamos, mas infelizmente não foi assim.
Fui transplantada por volta das 20h00. No dia seguinte tudo corria bem, os valores baixaram, devagar, mas baixaram, até que depois deixei de urinar e os meus valores voltaram a subir. Fiz ecografias e mais ecografias e só me diziam que não viam nada de anormal nas ecografias. Passado uns cinco dias comecei a ganhar febres altas e a cicatriz começou a infetar.
Foi-me colocado um cateter na virilha para iniciar a hemodiálise, pois o rim novo não estava de todo a trabalhar. Fiz as sessões todas cheia de febres altas, até que no dia 18 de maio, passado 13 dias do transplante, e no dia dos meus anos, o rim foi retirado, pois já estava a “apodrecer” dentro de mim.
Passado uns dias foi-me colocado outro acesso no pescoço. No dia 3 de junho tive alta, pois o antibiótico podia ser administrado durante as diálises. Fui colocada na clínica DaVita das Gaeiras. Como tinha muita vontade em voltar para a diálise peritoneal, fui a uma consulta a Santa Maria para ver se poderia reiniciar, e assim foi, reiniciei, mas por pouco tempo.
Passado 15 dias voltei a ganhar febres altas, fui às urgências do Hospital de Santa Maria e fiquei internada de imediato. Depois de muitos exames e mais exames, chegaram à conclusão que a febre vinha do cateter da diálise peritoneal. Fui logo operada para o extrair, e foi-me dito que a infeção já estava no trajeto e, se tivesse passado para o peritoneu, não tinham antibiótico para esse tipo de bactéria!
Depois de tudo estar bem e de ter de voltar a hemodiálise, estive um ano para me fazerem um acesso no braço. Depois de muito pedir e ter de me chatear, lá me chamaram para ser feito. Mesmo sabendo que os acessos são muito suscetíveis a infeções. Mas pronto, cá estou na clínica de diálise.
Por enquanto tudo corre bem, tudo dentro do normal. Nesses anos todos depois do transplante, foi-me dito na última consulta de pré-transplante renal em Coimbra que a minha chance de voltar a ser transplantada é de 1 em 3 milhões, pois o meu organismo ganhou demasiadas defesas contra os rins que poderiam ser compatíveis comigo.
Deram-me 3 hipóteses: ou entrar na lista de superurgentes nacional (que pode não ser aceite); ou transplante de dador vivo (coisa que sempre excluí); ou continuar em hemodiálise. Neste momento, e penso que será para sempre, vou escolher a hemodiálise.
Infelizmente, o meu caso não correu bem, e não vejo o transplante como muitos nos querem fazer ver, uma solução ou uma cura. Isto quando corre bem, porque quando não corre, ficamos com sequelas físicas e psicológicas. Vou estando na diálise três vezes por semana no terceiro turno, e quero salientar a importância das clínicas de hemodiálise para quando existe pessoal mais novo, ainda com vontade de viver e com a vida ativa.
Tentem juntar essa malta nova, porque a mim por mais que me desse bem com os meus antigos colegas de sala, desde que fui colocada com os meus novos companheiros de luta, que são mais da minha idade e malta que brinca durante as sessões, faz com que tudo seja mais fácil e não vou com aquela tristeza que antes sentia. Saio de lá mais animada e com vontade de seguir em frente.
Agradeço aos meus colegas de sala por me aturarem… e eu a eles! Quero acabar para agradecer à minha família, que de tudo fazem para me ajudar, aos meus filhos e marido que sempre estão lá quando não estou nos “meus dias” e a paciência que têm, porque eu sei que para eles também não é fácil.
Muito obrigada também a essa mulher forte que me convidou para escrever este texto. Cláudia, obrigada!